Uma investigação conduzida nos últimos quatro meses identificou que pelo menos 200 contratos públicos de pavimentação em cidades de oito estados brasileiros podem estar vinculados a pedreiras onde trabalhadores atuam em condições análogas à escravidão. Relatórios do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) mostram que os trabalhadores, muitas vezes sem equipamentos de proteção, água potável ou banheiros, extraem pedras manualmente para calçamentos em municípios como Taperoá (PB), cenário de “O Auto da Compadecida”. As construtoras envolvidas, que vencem licitações com preços baixos, não rastreiam a origem do material, enquanto prefeituras não fiscalizam as condições de trabalho.
A cadeia produtiva é marcada por informalidade, com pagamentos em dinheiro e falta de notas fiscais. Em alguns casos, empresas autuadas continuam a receber contratos públicos, inclusive com recursos federais. Trabalhadores resgatados relatam retornar às pedreiras por falta de alternativas, enquanto autoridades defendem maior responsabilização de prefeituras e órgãos contratantes. Apesar da existência da “lista suja” do trabalho escravo, a legislação atual não impede a participação dessas empresas em licitações, a menos que haja condenação judicial definitiva.
Especialistas apontam que a exploração persiste devido à falta de fiscalização e à demanda por preços baixos nas licitações. Auditorias recentes buscam rastrear o destino das pedras e responsabilizar toda a cadeia, mas enfrentam desafios como a terceirização da produção e a dificuldade em comprovar vínculos trabalhistas. A reportagem destaca a urgência de políticas públicas que combatam não apenas as violações nas pedreiras, mas também a cumplicidade indireta de gestores que contratam obras sem verificar as condições de trabalho.