A tradição de substituir carne vermelha por bacalhau durante a Quaresma, especialmente na Sexta-Feira Santa, tem raízes históricas e religiosas profundas. Especialistas explicam que o costume foi herdado de Portugal, país colonizador do Brasil, e está ligado à prática do jejum como forma de penitência e reflexão sobre o sacrifício de Jesus. O peixe, símbolo do cristianismo primitivo, ganhou ainda mais relevância por sua simbologia teológica e pela praticidade de conservação, já que o bacalhau, curado e salgado, resistia ao clima tropical sem refrigeração.
O hábito de evitar carne vermelha remonta à Idade Média, quando teólogos como São Tomás de Aquino associaram seu consumo ao prazer e à luxúria, contrastando com a austeridade do período sagrado. Já o peixe, além de ser um alimento comum nas narrativas bíblicas, tornou-se um símbolo cristão por sua representação acrônima em grego antigo (“ichthys”), que remetia a Jesus Cristo. A flexibilidade na definição do que seria um “peixe” também permitiu adaptações locais, como o consumo de jacarés ou capivaras em algumas regiões.
No Brasil, a popularização do bacalhau ocorreu no século XIX, com a chegada da corte portuguesa, que trouxe o produto como parte de sua culinária. A facilidade de armazenamento e o apelo comercial consolidaram a tradição, que persiste até hoje. Embora não haja uma determinação eclesiástica específica sobre o bacalhau, a prática se mantém como um exemplo de como rituais religiosos se entrelaçam com cultura e pragmatismo.