A representação de Iemanjá no Brasil, uma das divindades mais veneradas nas religiões afrobrasileiras, passou por um processo de embranquecimento ao longo da história, assim como ocorreu com a imagem de Jesus Cristo. A cultura europeia, dominante durante o período colonial, influenciou a forma como essa divindade foi retratada, criando uma figura branca, magra, com cabelos lisos e um vestido azul, em contraste com as origens negras de Iemanjá. Esse fenômeno está relacionado ao processo de sincretismo religioso, onde elementos de diferentes crenças, como o catolicismo, foram incorporados ao candomblé e à umbanda.
A imagem de Iemanjá branca se consolidou especialmente no contexto da umbanda, religião sincrética surgida no início do século XX. No entanto, para muitos estudiosos e praticantes de religiões afrobrasileiras, essa representação não condiz com a verdadeira essência da divindade. Iemanjá, como outros orixás, é uma força da natureza e não possui uma cor definida, sendo um símbolo de fertilidade e energia. A crítica à imagem branca, além de questionar a estética ocidental, também aborda um processo de “epistemicídio”, onde saberes e culturas afro-brasileiras são apagados ou desvalorizados.
Embora o debate sobre a cor de Iemanjá esteja presente em diversos terreiros e movimentos religiosos, ainda predomina a representação branca da divindade em várias celebrações, como na festa de 2 de fevereiro em Salvador. Alguns líderes religiosos, no entanto, defendem que a discussão sobre a cor de Iemanjá deve ser feita com respeito, sem desrespeitar as diferentes representações existentes. O processo de educação e conscientização é visto como essencial para que a figura negra de Iemanjá seja reconhecida sem criar divisões, mas sim promovendo o respeito pelas várias formas de culto e crença.